terça-feira, 19 de julho de 2011

O outro lado da moeda podre

Sobra dinheiro para corromper, faltam recursos para investir na melhoria da infraestrutura do país.

O outro lado da moeda da avalanche de irregularidades que assola a área de transportes do governo federal é o ritmo lento das necessárias obras de melhoria da infraestrutura do país. Sobra dinheiro para corromper, faltam recursos para investir.

O Ministério dos Transportes dispõe de uma das mais altas dotações para investimento do Orçamento Geral da União. Neste ano, R$ 17,1 bilhões estão disponíveis para gastar em obras. Do valor, porém, apenas R$ 1,1 bilhão foram aplicados até agora – outros R$ 5 bilhões foram quitados neste ano, mas referem-se a restos a pagar de orçamentos passados.

O baixo desempenho não é novidade. Nos últimos oito anos e meio, nada menos que R$ 44,7 bilhões deixaram de ser investidos na melhoria de nossas rodovias, ferrovias e hidrovias, segundo a ONG Contas Abertas. De uma dotação de R$ 103,1 bilhões desde 2003 até hoje, o ministério executou R$ 58,4 bilhões (56%). (Os valores foram atualizados pela inflação.)

Quem vê um desempenho orçamentário como este pode até pensar que vivemos na Alemanha, com sua impecável infraestrutura viária. Mas não é necessária mais que uma voltinha pelas nossas estradas esburacadas para concluir que a realidade é outra e a urgência dos investimentos, um imperativo.

O país dispõe de 1,5 milhão de km de estradas, mas apenas 212 mil km são pavimentados. Ou seja, 86% das nossas vias são em terra, conforme mostrou O Globo em sua edição de domingo. Segundo a Confederação Nacional dos Transportes, 25% das estradas brasileiras são classificadas como ruins ou péssimas.

Para mudar o panorama é preciso muito, muito dinheiro. Segundo o instituto Ilos, para tornar nossas estradas boas ou ótimas seria necessário investir R$ 64,7 bilhões em recuperação. Outros R$ 747 bilhões precisariam ser empregados em pavimentação.

O governo petista adora dizer que o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) está dando conta do recado de “revolucionar” a infraestrutura nacional. Seria bom se fosse verdade. Para as rodovias, a previsão federal é investir R$ 43,5 bilhões em quatro anos, ou meros 5% do que o Ilos considera minimamente necessário.

Ainda assim, o PAC mantém-se muito distante de suas metas e mostrou-se, até agora, incapaz de alterar o patamar de investimentos em infraestrutura no país. Estudo do economista Cláudio Frischtak, da InterB Consultoria, divulgado por O Globo, mostra que a média aplicada no setor entre 2008 e 2010 foi de 2,62% do PIB, pouco superior aos 2,32% do PIB apurados ao longo da década passada.

Outro exemplo emblemático da má execução orçamentária em favor da roubalheira está na área aeroportuária. A incapacidade de nossos terminais para dar conta do aumento de tráfego é mais que evidente, mas o ritmo de resposta das autoridades federais continua o mesmo: insuficiente e lento.

Tão inadequado, que agora a Infraero anuncia que terá de contratar em caráter emergencial – portanto, sem incômodas licitações – a construção do novo terminal de passageiros de Cumbica, em Guarulhos (SP). A empresa escolhida para executar a obra é a Delta Construções – sempre ela… – e o valor do contrato é de R$ 85,75 milhões, revela o Valor Econômico.

Nada disso impede o governo Dilma Rousseff de insistir em suas mistificações. O Estado de S.Paulo divulga hoje que, para superar a pauta negativa das denúncias de corrupção, a presidente da República pretende apresentar um balanço cor-de-rosa do PAC em agosto. “A ideia da presidente é aproveitar o recesso parlamentar para bater na tecla de que a crise é ‘página virada’ e que ela está preocupada com a gestão do governo”.

O PT tem compulsão pelo marketing, mas nenhuma propaganda, por mais massiva que seja, consegue superar a dura realidade. E esta continua a mostrar que a eficiência petista, personificada na figura da presidente, não passa de peça de campanha. No paralelo, a corrupção corre solta; para isso, sobra expertise.

Fonte: ITV – Carta de Formulação e Mobilização Política Nº 279

Este e outros textos analíticos sobre a conjuntura política e econômica estão disponíveis na página do Instituto Teotônio Vilela

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